Como o livre mercado combate a discriminação

How Free Markets Break Down Discrimination · Tradução de Ordem Livre
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Uma das minhas falas favoritas no clássico “Sete homens e um destino” acontece quando um caixeiro viajante e seu parceiro se oferecem para pagar ao coveiro local pelo transporte de um índio morto ao cemitério. O coveiro se recusa. Ele explica que até gostaria de fazer isso, mas os habitantes da cidade sentiam tamanha rejeição pelo enterro de índios junto com brancos que ele não conseguiria persuadir nem mesmo seu motorista a transportar o corpo. Um dos vendedores diz, “ele é racista, não é?” O coveiro responde: “Bem, quando se trata de salvar a própria pele, ele é bem intolerante”.

As experiências com a liberdade econômica ilustram uma ideia oposta: quando se trata de salvar suas vidas econômicas, mesmo aquelas pessoas que anteriormente eram preconceituosas se tornam completamente tolerantes. A razão disso é que o mercado faz com que as pessoas paguem por seus preconceitos a menos que discriminem em favor do que é mais lucrativo. Além disso, os governantes e seus funcionários raramente arcam com os custos da discriminação de minorias impopulares – na verdade, na maior parte das vezes, eles obtêm benefícios – por isso, as piores histórias de discriminação têm o Estado como protagonista.

A ideia de que os mercados combatem a discriminação não é novidade. Há mais de 200 anos, Voltaire escreveu:

Vá ao mercado de ações de Londres […] e você verá representantes de todas as nações reunidos a serviço da humanidade. Lá, os judeus, os muçulmanos e os cristãos fazem negócios entre si como se pertencessem à mesma religião e só chamam de infiéis aqueles que vão à falência.

Voltaire estava mostrando que as pessoas no mercado de ações de Londres queriam tanto ganhar dinheiro que estavam dispostas a fazer negócios com pessoas de religiões e culturas diferentes. Isso parece uma observação óbvia, mas aparentemente não é. Quantas vezes você já ouviu as pessoas denunciarem os homens de negócios por perseguirem cegamente os lucros e, logo em seguida, castigarem aqueles mesmos homens de negócios por discriminarem um grupo minoritário só por ser minoritário? Então qual das opções é a correta? Será que estão tentando maximizar seus lucros ou estão discriminando grupos? Não dá para fazer as duas coisas ao mesmo tempo.

A discriminação institucionalizada

Pense sobre os casos mais famosos de racismo. Há grandes chances de você pensar em um governo implementando medidas racistas e em indivíduos se opondo a elas por perseguirem o lucro. Pense no apartheid na África do Sul. O regime do apartheid e a “segregação racial” que o precedeu ilustram ambos os pontos. Do início dos anos 1920 até o início dos anos 1990, o governo da África do Sul impôs barreiras para impedir que os empregadores colocassem negros em bons empregos, especialmente nas minas. Em outras palavras, o governo impôs oficialmente a discriminação. Os maiores oponentes dessa discriminação e os mais fortes defensores da tolerância eram os empregadores brancos. Eles odiavam a proibição governamental que os impedia de contratar negros bem qualificados para trabalhar nas minas e em qualquer outro lugar. O que também é interessante é encontrarmos entre os mais fervorosos defensores da discriminação de cor e, mais tarde, do próprio apartheid, os sindicatos brancos.

Na verdade, em 1923 aconteceu um fato, sob a vigência da segregação racial, que foi tão impressionante que essa história deveria ser contada por pais de todos os lugares aos seus filhos e ser sempre comentada em cafés. Uma greve foi declarada pelos membros do poderoso Sindicato dos Trabalhadores das Minas, composto por brancos, que protestavam contra os planos dos proprietários brancos das minas, de contratar trabalhadores negros, que recebiam salários mais baixos. O cartaz que eles carregavam pelas ruas orgulhosamente dizia, “Trabalhadores em todo o mundo, uni-vos para lutar por uma África do Sul branca.” Nesse slogan, onde Karl Marx se encontra com David Duke, encontramos mais evidências da ligação entre o poder governamental (o socialismo é o último degrau para a dominação do poder governamental) e a discriminação racial. O que é interessante é que o sindicato recebeu apoio nessa greve dos seus aliados no Partido Trabalhista da África do Sul (SALP), formado em 1808 com o objetivo explícito de obter privilégios para os trabalhadores brancos. O SALP foi intencionalmente baseado no Partido Trabalhista Britânico, um partido abertamente socialista.

E se você acredita que esse tipo de coisa não acontece nos países desenvolvidos, então pesquise as origens da lei do salário mínimo. Quando foi introduzido nos Estados Unidos, os principais proponentes do salário mínimo eram os sindicatos do norte do país, que desejavam prejudicar seus competidores do sul que pagavam salários mais baixos, sendo muitos desses competidores negros. Esse objetivo movia os sindicatos até recentemente, por volta dos anos 1950. Em 1957, em uma audiência sobre o aumento do salário mínimo, um senador do norte dos Estados Unidos que era a favor dele afirmou: “É claro que termos no mercado uma numerosa fonte de força de trabalho barata derrubará também os salários fora desse grupo – os salários daquele trabalhador branco que terá que competir. E quando um empregador pode substituir um trabalhador por um negro, de baixos salários – e existem, conforme você apontou, essas centenas de milhares deles procurando por um trabalho decente – isso afeta toda a estrutura de salários de uma área, não é?”

Quem era esse senador? Só uma pista: apenas quatro anos depois ele era o presidente. Seu nome era John F. Kennedy.

Pela discriminação

A descoberta de que os mercados derrubam a discriminação é tão importante que Gary Becker, o primeiro economista que demonstrou essa afirmação em um modelo rigoroso, ganhou o Prêmio Nobel, em parte, por esse trabalho. Em seu livro “The Economics of Discrimination” (A Economia da Discriminação), Becker mostrou que o livre mercado faz com que os discriminadores paguem por seu preconceito porque abrem mão das oportunidades de trabalhar com pessoas produtivas. Ele mostra que isso não significa que as pessoas em um livre mercado nunca discriminarão alguém; os racistas mais extremos e intolerantes geralmente escolherão arcar com os custos da discriminação. Mas eles pagarão por isso.

O livro de Becker mostrou que a diferença salarial entre trabalhadores negros e brancos de certa capacidade e nível de experiência pode ser uma medida da discriminação remanescente contra os trabalhadores negros; quanto maior for a diferença, se as demais condições permanecerem iguais, maior será a discriminação enfrentada pelos trabalhadores negros. Esse pensamento tem sido mal utilizado de duas maneiras nos diversos processos judiciais relativos à discriminação nos Estados Unidos. É um mau uso da estatística supor que toda diferença salarial entre brancos e negros se deve à discriminação e não a outros fatores que o pesquisador não mediu. Ainda assim, como quase todo economista que estuda os dados salariais admitiria, você nunca pode dar conta de todos os fatores, especialmente aqueles que você não consegue observar. Você não pode estimar a renda de alguém somente a partir de sua idade, experiência, filiação sindical e nível educacional. Muitas pessoas têm a mesma idade que Bill Gates e são similares a ele em vários outros aspectos, porém, nenhuma delas chega perto de seu nível de riqueza.

O segundo mau uso das ideias de Becker é uma violação ainda maior da justiça. Os trabalhadores que se sentem discriminados às vezes processam seus empregadores, quase sempre em busca de recompensas. O que não conseguem reconhecer é que são esses empregadores, os quais empregam negros e membros de outras minorias, que estão ajudando a eliminar a discriminação. Se os salários baixos são causados pela discriminação, ela é praticada por aqueles que não contratam pessoas pertencentes aos grupos discriminados. Mas vocês já não ouviram falar daquele ministro que culpou as pessoas que compareceram a um evento por a plateia estar vazia?

Devemos notar que a economia dos Estados Unidos também não é livre, mas restringida por várias intervenções governamentais anticompetitivas, como a exigência de licenças para exercer inúmeras profissões. Ainda assim, a competição é a chave para se minimizar a discriminação. Dessa maneira, a melhor coisa que aqueles que se opõem à intolerância podem fazer é trabalhar pela eliminação de todas as intervenções.

De qualquer forma, o que é mais importante é que as pessoas sejam livres para discriminar. A liberdade inclui a liberdade de associação, a liberdade de escolher para quem você trabalha e quem você emprega. Os empregados são livres para discriminar empregadores pela razão que desejarem; os empregadores devem ter a mesma liberdade. Vamos deixar que os mercados – e não os governos – punam aqueles que agem de acordo com os seus preconceitos.